Cartões mnemônicos resumindo conceitos fundamentais para a monitorização prolongada de EEG em terapia intensiva. Texto organizado pelo responsável médico da Kandel, Edrin Vicente, Neurologista.
INTERPRETAÇÃO DO EEG NO PACIENTE CRÍTICO
INDICAÇÕES PARA MONITORIZAÇÃO DO EEG
Detecção de crises subclínicas
Flutuação de consciência
Alteração inexplicada de consciência
Lesão supratentorial aguda com alteração e consciência
Após estado de mal convulsivo (20% continuam tendo crises não-convulsivas após estado de mal).
Caracterização de episódios
Postura tônica e outros paroxismos
Nistagmo, desvio ocular, mastigação
Paroxismo autonômico, episódios de taquicardia
Prognóstico
Não há diagnóstico adequado de coma sem o EEG”
Manejo de coma induzido
Especialmente coma induzido para tratar hipertensão intra-craniana ou status epilepticus.
Detecção de isquemia
Vasoespasmo após HSA ou procedimentos vasculares
Pacientes com distúrbio hemodinâmico.
PRINCÍPIOS DE INTERPRETAÇÃO
Os padrões de EEG em coma diferem dos padrões do sono/li>
À medida que o coma se aprofunda muda o padrão do EEG, mas o modo como a progressão se estabelece é variável
A maior parte dos padrões é inespecífica
Alguns padrões tem valor prognóstico
Guidelines de 2012 da ACNS sugerem deixar de usar os termos “ictal”, “interictal” ou “epileptiforme” para padrões cuja relação com ocorrência de crises não é definitiva e também colocar em plano secundário a descrição “ondas trifásicas”, cuja associação com etiologia metabólica depende de correlação clínica
Em contexto de pesquisa, a ACNS recomenda reservar a descrição de “crise eletrográfica” apenas para atividade rítmica ≥ 4Hz com clara evolução ou espícula-onda ≥ 3Hz. A caracterização de outros padrões como “ictais” depende de correlação clínica e está fora do escopo do guideline 2012.
ARTEFATOS FREQUENTES E ASPECTOS TÉCNICOS DO EEG NA UTI
Montagens simplificadas (ex: 4 eletrodos de cada lado: Fp1, F7, T4, T5) reduzem sensibilidade para detectar crise a cerca de 70% e para atividade periódica a 50%,
Usar montagem completa 10-20 em dupla banana e montagem referencial a eletrodo médio,
Referencial em Cz, livre de artefato muscular,
Para diferenciação entre “artefatos” e ritmos “biológicos” é fundamental registro de vídeo e correlação clínica,
Se houver ferida cirúrgica, deslocar o eletrodo da área ideal e colocar o contralateral em posição simétrica,
Usar eletrodos descartáveis ou esterilizados,
Diálise com ultrafiltração,
Breach - atividade rápida de alta amplitude em região de craniotomia.
Percussão - torácica ou de leito: ritmicidade “súbita”, sem evolução. Diferenciar de SIRPIDs.
Ventilação mecânica - verificar líquido no tubo.
Nistagmo - confirmar pelo exame clínico.
Kandel Card 2: PADRÕES DE EEG E SEU SIGNIFICADO.
10 PADRÕES DE EEG EM PACIENTES EM COMA E SEU SIGNIFICADO
Os padrões de EEG em coma diferem dos padrões do sono
À medida que o coma se aprofunda muda o padrão do EEG, mas o modo como a progressão se estabelece é variável
A maior parte dos padrões é inespecífica, alguns tem valor prognóstico
Consulte os Guidelines 2012 da ACNS para maiores detalhes em relação a cada padrão.
IRDA: Atividade rítmica delta intermitente: sinusoidal frontal (ou occipital em crianças), simétrica, síncrona, bloqueada por abertura ocular, geralmente aparece após a perda do alfa occipital. Alguma alteração de consciência.
Delta contínuo de alta voltagem: polimórfico, assíncrono, difuso, inicialmente atenuado por estimulação, com a progressão torna-se arreativo. Etiologia: metabólica ou estrutura envolvendo substância branca. Associado a pior prognóstico.
GPDs contínuos < 1/s: OAs, espículas ou ondas lentas bilaterais. À medida que coma aprofunda, intervalo entre GPDs amplia e atividade entre eles reduz. Comum após anóxia ou infecção (Pan-encefalite esclerosante, Jacob-Creutzfelt).
Baixa voltagem (<20µV) persistente com ritmos teta e delta, arreativo (artefato de movimento após estimulação não caracteriza reatividade). Não confundir com EEG normal de baixa amplitude, que possui ritmos alfa e beta. Padrão associado a lesão cortical e subcortical severa. Geralmente evolui para estado vegetativo ou morte.
Alfa coma: alfa de predomínio frontal em paciente em coma. Tende a surgir horas após o insulto. Quando relacionado a anoxia ou lesão estrutural geralmente o prognóstico é ruim. Não costuma ocorrer em crianças.
GPDs contínuos a 2/s com morfologia trifásica: síncronas, frontais, com gradiente de fase AP. Paciente responsivo. Etiologia metabólica, estrutural, degenerativa ou hipertensão intracraniana. Nota: “onda trifásica” pode ter 2 fases. O que define é a fase negativa maior, que pode ser precedida e seguida por outras fases positivas menores.
LPDs: atividade periódica de ondas agudas, espículas ou lentas, predominando sobre um hemisfério, monomórficas. Geralmente aparecem após lesões agudas.
Surto-supressão: à medida que o coma se aprofunda, aumenta a duração da “supressão” e reduz a do “surto”. Etiologia: encefalopatia anóxica, sedação, hipotermia.
Inatividade elétrica cerebral em registro de 16 canais, distância dupla, impedância <10kΩ > 0,1kΩ, arreatividade, filtros 0.5 a 70Hz, sensibilidade 2 µV/div, artefatos de ECG e EMG não impedem diagnóstico, ruído do amplificador < 2µV. Descartar hipotermia ou sedação. Coma irreversível. Evolução para morte ou estado vegetativo.
Spindle coma : fusos e elementos de estágios I a IV, porém sem sono REM. Complexos K à estimulação. Presença de fusos indica preservação funcional e bom prognóstico. Fusos diminuem à medida que o coma se aprofunda
Kandel Card 3
CRITÉRIOS NO EEG PARA DIAGNÓSTICO DE STATUS NÃO-CONVULSIVO (BENICZKY 2013):
Atividade rítmica ≥ 2.5 Hz ou
atividade rítmica < 2.5 Hz e ≥ 0.5 Hz* surgindo de ritmo basal não-rítmico, evolução gradual em frequência (término típico com involução de frequência), distribuição espacial ou morfologia.
Atividade rítmica < 2.5 Hz com mehora clinica ou normalização do EEG em reposta a diazepínico IV
Procure identificar nas imagens abaixo quais critérios para definição de crise estão presentes
Incidência de crises em pacientes de UTI com indicação para EEG (Claasen 2004, Jette 2006)
∽40% na população pediátrica,
∽35% em pacientes com passado de Epilepsia,
∽30% em pacientes com infecção de SNC,
∽20% em pacientes com TCE, HSA, tumores, encefalopatia hipóxica ou metabólica,
∽10% em AVCI (principalmente cardioembólico ou extenso) e AVCH, (principalmente cortical ou por MAV).
Por quanto tempo monitorizar?(Claasen 2004)
Em UTI, ∽90% das crises são não-convulsivas. Se o objetivo é a detecção dessas, 48 horas de EEG detectam 98% dos casos entre pacientes não-comatosos e 87% dos casos entre comatosos.
Qual o impacto na conduta? (Vespa 1999)
Em ∽90% dos casos os resultados do EEG influem na conduta clínica. Vespa, em estudo com 300 pacientes em 1999, mostrou também redução na estadia e melhora no prognóstico.
Que padrões tem maior associação com ocorrência de crises?
GPD ∽30% tem também crises eletrográficas
BiPD ∽40% tem crises
LPD ∽70% tem crises
PDs possivelmente são associados a maior morbimortalidade, porém não se sabe em que grau ou se a ligação é indireta.
Fatores de risco de crise em neonatos
Apgar ≤5 aos 5 min, pH umbilical abaixo de 7.2 na 1ª hora, infecção de SNC, sepsis sintomática, anomalia cerebral congênita, hemorragia intra-ventricular grau III ou IV, apneia de causa desconhecida.
EEG NORMAL NO PERÍODO NEONATAL
Montagem
Até 6 semanas ou 40cm de circunferência,
Evitar Fp1 e Fp2 (tem pouca atividade de EEG),
Usar Fp3 e FP4 em montagem com 11 canais,
Não esquecer de estimular a criança para ver reatividade do EEG.
Intervalos inter-burst máximos aceitáveis (Hahn JS 1989)
<30 sem 35s,
31-31sem 20s,
34-36sem 10s,
37-40sem 6s.
Elementos na avaliação da atividade de base e da maturidade
Continuidade: no prematuro o EEG é descontínuo, alternando períodos de amplitude alta (bursts) com baixa (intervalo-interburst). Com o amadurecimento, o interburst encurta e o EEG evolui para contínuo.
Sincronia: Atividade que surge com atraso menor que 1.5 segundos entre hemisférios é síncrona.
Simetria de composição (frequências) e voltagem: Mesmo em prematuros o EEG deve ter simetria de amplitude e frequências. Em geral, assimetrias acima da razão de 2:1 levantam suspeita de anormalidade.
Presença de elementos característicos da idade.
Maturação do EEG - Vigília e Sono ativo Sono Calmo
Sincronia, Intervalo e amplitude interburst.
(<29sem) EEG idêntico em sono ou vigília. ArreativoDelta occipital monorrítmico, teta rítmico Occ e Temp, Delta brushes.
100% de simetria, interburst ~12s e <25µV
(30sem): Vigília e sono ativo com interbursts mais curtos e menos amplitude que no sono calmo. EEG começa a ficar reativoDelta brushes predominam em sono ativo
70% simetria, interburst ~8s e <25µV
(32sem):Em vigília e sono ativo o EEG vai deixando de se tornar descontínuoDelta occipital rítmico mais ativo. Teta rítmico progride a temporal.
80% simetria, interburst ~5s e <25µV
(36sem):Vigília se torna contínua com padrão activité moyenne (mix de delta e teta com amplitude média)Delta occ rítmico desaparece. Amplitude interburst aumenta em sono calmo (Tracé alternant)
85% simetria, interburst ~4s e >25µV
(40sem):Em sono calmo, o padrão contínuo de ondas lentas vai substituindo o tracé alternant (TA)Brushes predominam em sono calmo
100% em TA e simétrico, interburst ~2s e >25µV
(44sem):EEG totalmente contínuo. Desaparece o tracé alternant. Sono calmo com ondas lentas maiores que em vigíliaBrushes desaparecem
EEG contínuo simétrico
(46sem):Estimulação durante sono contínuo de ondas lentas leva a clara atenuação de voltagem e redução de deltaSurgem fusos do sono em regiões centrais
EEG contínuo simétrico >
AM: Activitée moyenne, TA: tracé alternant, CSWS: sono contínuo de ondas lentas, TD: tracé discontinue
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